Discurso aos formandos em História na cerimônia de 28 de março de 2023
Tive a honra de ser convidado para ser Paraninfo da turma 2022/2 do Curso de História da UFSC:
Queridos(as) formandos(as)
O momento é de congratulação e de vitória, por vocês terem cumprido uma longa trajetória de estudos para a formação de historiadores. Como Bacharéis e Licenciados em História vocês possuem condições para pesquisar a História e transmitir os conhecimentos adquiridos. Mas a educação não é apenas transmissão de conhecimentos, é uma capacidade imponderável de interagir com o mundo e com as pessoas que nos proporciona alegrias e satisfações.
Esta turma passou pela pandemia de covid 19 e adaptou-se, durante alguns semestres, a formas de ensino remota que se não são as mais adequadas, mas eram as disponíveis naquele momento e agora vocês encontram-se prontos para enfrentar a missão de historiadoras e historiadores. É óbvio que qualquer um de vocês pode se indagar secretamente: será que estou mesmo pronto como profissional?
Saibam que profissionais com décadas de trabalho também se perguntam da mesma maneira. A rigor, nunca estamos prontos, pois sempre há algo a aprender no vasto campo de nossa atuação e na riqueza de nossa ciência e arte, que está sempre em renovação. Mas vocês já dispõem das ferramentas para caminhar por conta própria e construir seus caminhos profissionais. Para os que não forem trabalhar com a História, penso que esta formação sempre será importante para sua vida, independente do destino. De qualquer maneira, sempre tenham a UFSC como sua casa, retornem para cá, participem de nossos eventos, da atividade dos Laboratórios de pesquisa e da pós-graduação.
Nossa área de conhecimento tem a capacidade de constante aumento da inteligibilidade da ação humana no planeta. A cada geração antigas fontes revelam novas respostas, tendo em vista a constante mobilidade das perguntas. Conhecer bem o presente só é possível com a História, assim como só podemos conhecer a História questionando nosso presente. A mútua inteligibilidade entre passado e presente faz parte de nossa formação e nossa vida profissional.
Nos últimos anos nunca foi tão fácil argumentar pela relevância e a utilidade da História como área de conhecimento fundamental para a cidadania, a democracia e a luta por uma vida melhor. Infelizmente a História ganhou relevância pelos lamentáveis ataques e crimes desferidos contra a democracia. Passamos por um terrível período de perseguição à ciência, a memória e à Universidade. Não podemos considerar esta situação completamente superada, tendo em vista a força política alçada por admiradores do nazi-fascismo entre significativos contingentes da população. Nós, professores de História , nos perguntamos: Como chegamos a este ponto? Como pode alguém negar o Golpe Militar de 1964 e os 21 anos de Ditadura que se seguiram? O negacionismo histórico vai muito mais fundo: negaram os quase 400 anos de escravidão africana e o genocídio dos povos indígenas. O negacionismo não é apenas uma atitude de ignorância inocente. Ele é base para a manutenção de políticas de privilégio aos de sempre, o negacionismo é um patamar para a reprodução de injustiças e para que se renovem a opressão e a exclusão de milhões.
Aqui em nossa casa, a UFSC, também temos tarefas a cumprir, como deveres de memória. Nossa Instituição, como outras Universidades brasileiras, foi alvo da ação por parte de órgãos de informação e espionagem, durante a Ditadura Militar. Professores, técnicos e estudantes foram perseguidos. Em muitos momentos, os órgãos de repressão contaram com a covarde colaboração de autoridades internas para perseguir, prender e torturar. Determinados indivíduos, homenageados por nossa Instituição, delataram colegas e colaboraram abertamente para o arbítrio da Ditadura e para o silenciamento e perseguição de estudantes. A UFSC formou uma Comissão da Memória e Verdade que pesquisou e levantou estes abusos e ilegalidades. O Relatório Final da Comissão faz algumas recomendações que ainda hoje estão a espera de uma decisão do Conselho Universitário para serem implementadas. Que façamos isso por aqui. Não há como esquecermos destes crimes, fingir que não aconteceram só fertiliza o terreno para que novas iniciativas antidemocráticas tenham curso. Se o Brasil tem um encontro marcado com o seu passado, a UFSC também. Precisamos acertar as contas com o passado para poder caminhar para a construção do futuro.
Quanto a nós, Historiadores, agora me dirijo a vocês como colegas, tenham em mente a nossa responsabilidade como profissionais de História, nunca deixem que as forças criminosas do passado voltem a governar nosso país e as mentes da nossa juventude.
Desejo uma jornada profissional com alegrias e realizações!
Boa noite!